História do Cinema: O Neorrealismo Italiano!

História do Cinema: O Neorrealismo Italiano! - Marcos Doniseti!
'Ossessione' (1943): Filme dirigido por Luchino Visconti é considerado o primeiro filme autenticamente Neorrealista, embora não tenha alcançado a mesma repercussão do clássico 'Roma Città Aperta' (1945), de Roberto Rossellini. Esta obra é que abriu o mercado internacional para os filmes Neorrealistas.  

'Ossessione' e as origens do Neorrealismo Italiano!

Durante muitos anos desenvolveu-se um debate sobre qual teria sido a origem do Neorrealismo Italiano, que foi um dos mais influentes e importantes movimentos cinematográficos da história. Martin Scorsese diz, no documentário ‘Viagem à Itália’, que este foi o mais importante movimento da história do Cinema. 

‘Roma, Cidade Aberta’ (1945) foi considerado pelos críticos, e por muitos anos, como sendo o marco inaugural do Neorrealismo, mas nem Roberto Rossellini e tampouco Luchino Visconti concordavam com isso.

A respeito dessa polêmica, Luchino Visconti declarou o seguinte: 

“Por mais que se diga... "mas, já havia ‘O Navio-Hospitale’, 'O Homem da Cruz’, de Rossellini, ou ‘Uomini sul Fondo’, de De Robertis, esses filmes, de fato, eram documentários. A meu ver, é absolutamente necessário deixar de lado os dois filmes de Rossellini que citei, porque eram fascistas, de propaganda fascista. De Sica ainda rodava filmes como ‘Teresa Venerdi’, ‘Un Garibaldino ai Convento’ e, pouco depois de ‘Obsessão’, realizou ‘A Culpa dos Pais’, que já seguia a mesma linha. [...] O termo "neorrealismo" nasceu com ‘Obsessão’.”.

Rossellini, por sua vez, afirmou o seguinte sobre as origens do Neorrealismo: 

“Se o chamado neo-realismo se revelou ao mundo de forma mais impressionante através de ‘Roma, Cíttà Aperta’, cabe aos outros julgar. Eu vejo o nascimento do neo-realismo mais para lá: Em primeiro lugar, em alguns documentários de guerra romanceados, nos quais também eu estou representado com ‘La Nave Bianca’; depois, nos verdadeiros filmes de ficção sobre a guerra, dos quais fui colaborador no roteiro, como ‘Luciano Serra Pilota’, ou realizador, como ‘L'uomo Dalla Croce’; por fim, e sobretudo, em certos filmes menores, como ‘Avanti cè Posto’,’L'ultima Carrozzella’ e ‘Campo de Fiori’, em que a fórmula do neorrealismo, se assim o quisermos chamar, vem se compondo através das criações espontâneas dos atores: de Anna Magnani e de Aldo Fabrizi, particularmente.”.
Luchino Visconti era chamado de 'Conde Vermelho', pois apesar da sua origem aristocrática ele era um marxista declarado. Mas ele sempre preservou uma grande autonomia em relação ao PCI, ao qual era ligado. 

Obs1: As afirmações de Rossellini e Visconti sobre as origens do Neorrealismo foram retiradas do capítulo ‘Neorrealismo Italiano’, de autoria de Mariarosaria Fabris, que está incluído no livro ‘História do Cinema Mundial’ (Fernando Mascarello; org.).

Foi o próprio montador de ‘Ossessione’, Mario Serandrei, o responsável por usar da expressão Neorrealismo, pela primeira vez, para definir este filme de Luchino Visconti, que foi realizado em 1943 e que foi repudiado pelo regime Fascista, pois mostrava uma imagem bastante ‘negativa’ (ou melhor, muito realista) da Itália.

O filme foi baseado no romance policial Noir de autoria de James M. Cain (O Destino Bate à sua Porta), mas Visconti omitiu essa informação do governo fascista para poder enganar a censura, pois o livro era um retrato duro e pessimista dos EUA da época da Grande Depressão, mostrando que a ascensão social seria possível somente por meio de atividades criminosas. 

Em função disso, posteriormente Visconti foi obrigado a admitir que havia se baseado no livro de James M. Cain a fim de poder distribuir e exibir o seu filme nos EUA.
'Toni' (1934): Filme de Jean Renoir já possuía todos os principais elementos que estão presentes em 'Ossessione', filme de Luchino Visconti que inaugurou o Neorrealismo Italiano. Isso se explica porque Visconti trabalhou como assistente de Renoir neste filme, que é um dos principais do chamado 'Realismo Poético Francês".

A história da criação de 'Ossessione' (1943), que é o filme-manifesto do Neorrealismo Cinematográfico Italiano, está diretamente ligada ao regime fascista, embora em uma situação de clara oposição ao mesmo, que entrou em rápido processo de decomposição em função das humilhantes derrotas na Segunda Guerra Mundial (norte da África, Grécia...).


Assim, durante o regime fascista nós tivemos a criação de uma revista, chamada 'Cinema', da qual saíram alguns dos principais criadores do Neorrealismo, como foram os casos de Luchino Visconti, Michelangelo Antonioni, Giuseppe De Santis, Antônio Pietrangeli, Gianni Puccini e Mario Alicata. E todos eles eram de Esquerda, possuindo uma formação marxista. 

Seus membros ficaram vários anos debatendo de que maneira seria possível renovar o cinema italiano, abandonando os filmes escapistas do estilo 'Telefine Bianchi' (que eram uma cópia das produções hollywoodianas), pois tinham a intenção de mostrar a realidade em que o povo italiano vivia, que era marcado por pobreza, fome, miséria e criminalidade. 

Portanto, existiu todo um intenso debate e uma elaboração teórica entre os criadores do movimento, sendo que isso se refletiu em uma série de textos que foram publicados em 'Cinema' e que anteciparam a produção dos primeiros filmes Neorrealistas. 

Para levar esse projeto de revolucionar o cinema italiano adiante, a ideia inicial de Luchino Visconti, que trabalhou como assistente de Jean Renoir em 'Toni' (1934) e em 'Les Bas-fonds' (1936), era adaptar um livro de Giovanni Verga ("L'Amante di Gramigna").

Verga era o principal escritor realista italiano, sendo o maior representante do chamado 'Verismo', que mostrava a vida dos miseráveis trabalhadores italianos em seus livros, mas a censura fascista não permitiu que o projeto do filme fosse levado adiante. 

A respeito da obra de Verga, Giuseppe De Santis e Mario Alicata escreveram e publicaram, em 1941, um texto na revista 'Cinema' e no qual eles diziam que era necessário levar para as telas do cinema a sua "arte revolucionária, inspirada numa humanidade que sofre e espera".

Obs2: Frase sobre Giovanni Verga foi retirada do livro 'O Neo-Realismo Cinematográfico Italiano', de Mariarosaria Fabris (pág. 96). 
A ideia inicial de Luchino Visconti era adaptar o livro de Giovanni Verga, mas a censura fascista não permitiu. Em função disso, Visconti escolheu fazer uma adaptação do livro de James M. Cain, mas escondeu essa informação para evitar a censura. O livro foi adaptado, em 1969, pelo cineasta neorrealista Carlo Lizzani.

Aliás, é bom ressaltar, como diz Mariarosaria Fabris em seu livro sobre o Neorrealismo Cinematográfico Italiano, que o filme 'Toni' (1934), de Jean Renoir, já possuía todos os principais elementos que estão presentes no primeiro longa-metragem que foi dirigido por Luchino Visconti, que foi 'Ossessione' (1943).

Assim, o tema central dos dois filmes é um crime passional, a trama gira em torno da história de um casal de amantes criminosos, o ambiente em que a história ocorre é uma realidade marcada pela pobreza e pelo desespero dos protagonistas, as filmagens foram feitas em cenários reais e existe um contraste entre as cenas filmadas dentro de ambientes fechados (tons escuros) e fora dos mesmos (tons claros).

Porém, como eu já afirmei, quando começou a filmar 'Ossessione', Visconti procurou esconder o fato de que o roteiro era uma adaptação de um livro de James M. Cain (O Destino Bate à Sua Porta), pois temia que este roteiro também fosse censurado. 

Outro fato relevante é que o roteiro de 'Ossessione' foi escrito por quatro membros da revista 'Cinema', que foram o próprio Visconti e, também, por Giuseppe De Santis, Gianni Puccini e Mario Alicata. Logo, fica claro que a história do filme e a sua produção eram fruto de um longo debate e de um trabalho coletivo, confirmando o nítido caráter de filme-manifesto do mesmo. 


Uma outra importante característica que mostra o quanto 'Ossessione' entrava em choque com a visão oficial que o regime Fascista tentava impor à sociedade italiana está relacionado ao papel das mulheres, pois a ditadura de Mussolini divulgava uma visão da mulher como sendo uma mãe dedicada, que gera muitos filhos e cuida da casa. 

Mas neste filme de Visconti elas são totalmente diferentes, tomando a iniciativa, enfrentando os homens, praticando a prostituição e cometendo crimes. Logo, essa era mais uma razão para que o regime Fascista tenha censurado 'Ossessione'.
Mussolini concordava com Lenin, que considerava o Cinema como sendo uma forma de arte de grande importância para influenciar as ideias e o comportamento da população. Foi por isso que ele investiu muito na construção da Cinecittà (Cidade do Cinema), imensos estúdios localizados nos subúrbios de Roma.
Mussolini e o Cinema Italiano!

O regime fascista, liderado por Mussolini, dava grande valor ao Cinema, que era a principal forma de entretenimento popular na era anterior à criação e massificação da Televisão e que atingia mesmo aquela parcela da população que era analfabeta e que constituía a maioria absoluta do povo italiano que, na época, ainda vivia na área rural e não tinha acesso à educação.

O 'Duce' Mussolini era um ex-socialista que rompeu com o movimento e, assim, tornou-se um líder da Extrema-Direita e inimigo mortal do Socialismo, o qual tentou exterminar, aliando-se a Hitler para atingir este objetivo. Ele considerava, tal como dizia Lenin, que o Cinema era a mais poderosa das artes, principalmente no aspecto de influenciar as ideias e o comportamento das massas populares.

Desta maneira, o Cinema era de grande importância para o regime fascista, que dependia da manutenção de uma sólida aliança política com as classes dominantes tradicionais da Itália para se manter no poder.

E para poder concorrer com a hegemônica produção de Hollywood, que dominava o mercado italiano (e mundial, claro), Mussolini chegou a construir uma indústria cinematográfica italiana independente que, inclusive, os EUA fizeram de tudo para destruir no Pós-Guerra.

Para isso, ele construiu a famosa ‘Cinecittà’ (Cidade do Cinema), nos subúrbios de Roma, que era um conjunto de grandes estúdios cinematográficos. Ela foi inaugurada em 1937 e produziu mais de 330 filmes até 1943, quando a Itália foi invadida pelos Aliados (EUA e Grã-Bretanha) em 10 de Julho do mesmo ano, invasão essa que começou pela Sicília.
Mussolini desfrutou de uma elevada popularidade nos anos 1930, principalmente após conquistar a Abissínia (atual Etiópia) em uma brutal guerra travada em 1935-1936. Mas a sua aliança com Hitler e as sucessivas e humilhantes derrotas da Itália na Segunda Guerra Mundial mostraram para os italianos o completo fracasso do seu regime, levando à uma insurreição geral no norte do país e que terminou com o fuzilamento de Mussolini. Depois, ele foi dependurado, ao lado de sua amante (Clara Petacci), em um posto de gasolina de Milão, no dia 25 de Abril de 1945.

No mesmo mês e ano (no dia 25 de Julho de 1943) o ditador Benito Mussolini foi derrubado do governo, ação essa que foi promovida pelo próprio Grande Conselho Fascista que o apoiara durante tantos anos. 

Essa iniciativa também contou com o respaldo das classes dominantes italianas (Burguesia, Nobreza, Igreja Católica, Forças Armadas, Monarquia) que sustentaram Mussolini e os fascistas no poder durante mais de 20 anos (Novembro de 1921 a Julho de 1943).  

Esta mudança de política por parte das classes dominantes italianas, que ocorreu em 1943, aconteceu pelo fato de que elas passaram a temer a rápida ascensão das forças de Esquerda (Socialistas, Comunistas e Azionistas) que estavam liderando a luta contra o Nazifascismo na Itália. Com isso, Mussolini acabou sendo derrubado e preso, colocando-se um fim no regime Fascista italiano. 

E no dia 08 de Setembro de 1943 o novo governo italiano, comandado pelo Marechal Badoglio, passou para o lado dos Aliados na Guerra, enquanto que os alemães invadiam o Norte e o Centro da Itália, onde criaram a "República Social Italiana", também chamada de ‘República de Saló’, pois a pequena cidade de Saló, na região da Lombardia, era a sua capital.

A 'República de Saló' foi um regime fantoche fascista, que formalmente era liderado por Mussolini (que havia sido libertado da prisão por um comando nazista liderado por um capitão da SS, Otto Skorzeny), mas que, na prática, era controlado pelos Nazistas alemães.
A revista 'Cinema' também foi criada pelo regime fascista de Mussolini. Seu diretor era Vittorio Mussolini, o filho mais velho do Duce. Nela se reuniu uma equipe de críticos esquerdistas que se propunha a renovar o cinema italiano e que foram os responsáveis pela criação do Neorrealismo, incluindo Luchino Visconti, Michelangelo Antonioni, Antônio Pietrangeli, Mario Alicata e Giuseppe De Santis. 

Devido à forte presença militar alemã no Norte da Itália, este governo nazifascista somente foi derrubado nos dias finais de Abril de 1945, quando Mussolini foi capturado e enforcado pela Resistência. Isso aconteceu depois de uma brutal guerra civil que devastou a região e na qual a Resistência antifascista teve um papel fundamental, lutando ao lado das tropas Aliadas. 

Inclusive, em alguns casos, a Resistência conseguiu expulsar os nazifascistas de algumas cidades do norte italiano sem necessitar do apoio das tropas Aliadas, tal como aconteceu em Gênova (essa história foi contada no filme 'Achtung! Banditi!', de Carlo Lizzani). 

Além da ‘Cinecittà’ (que começou a funcionar em 1937) o regime fascista também apoiou a criação de uma ‘Escola de Cinema’, chamada de Centro Sperimentale di Cinematografia’, que começou a funcionar em 1936 e que formou inúmeros diretores, atores, atrizes, roteiristas e técnicos.
Muitos destes profissionais tiveram um papel fundamental nas produções Neorrealistas, bem como em todo o cinema italiano do Pós-Guerra. 

Michelangelo Antonioni foi um destes profissionais, sendo que, tal como Visconti, ele também trabalhou na França, como assistente de Marcel Carné, no filme 'Les Visiteurs du Soir' ('Os Visitantes da Noite'; 1942), o que mostra a nítida conexão existente entre o Realismo Poético Francês e o Neorrealismo Italiano.
Cartaz do primeiro Festival de Cinema de Veneza, que é o mais antigo do mundo. Como se percebe pelo cartaz, o Festival de Cinema era parte integrante da Bienal. Posteriormente, ele se tornou um evento separado, ocorrendo anualmente a partir de 1935. O Festival é um dos três mais importantes do mundo, ao lado dos Festivais de Cannes e de Berlim. Em 1946 foi criado o 'Leão de Ouro', para premiar o melhor filme.

Marcel Carné era um dos principais nomes do chamado Realismo Poético Francês, principal tendência do cinema francês dos anos 1930 e que também procurou mostrar a vida dos pobres, dos trabalhadores e dos marginalizados (prostitutas, desempregados, pequenos criminosos) em seus filmes. 

E durante o governo de Mussolini também tivemos a criação da revista ‘Cinema’, que era publicada a cada quinze dias e que tinha Vittorio Mussolini (o filho mais velho do Duce) como diretor, e a criação do 'Festival de Veneza', que teve a sua primeira edição em 1932, ainda como parte da Bienal que se realizava na bela cidade italiana. 


É bom ressaltar que Veneza foi escolhida para sediar o Festival por ser uma cidade essencialmente turística e que atraía muitos estrangeiros, o que mostra como a principal preocupação de Mussolini era o de utilizar o Cinema para fins de propaganda do regime Fascista.

É bom ressaltar que embora o odioso e criminoso regime Fascista tenha fracassado em praticamente todos os setores de atuação (indústria, agricultura, militar, social, etc), na área cinematográfica a política do governo de Mussolini acabou sendo bem sucedida, com os filmes italianos aumentando a sua participação no mercado de 13% (1938) para 40% (1942).

Obs3: Esta informação sobre o aumento da participação dos filmes italianos no mercado foi retirada do texto "A Lição Neo-Realista", de autoria de Isabel Regina Augusto. 

Vittorio De Sica, Roberto Rosselini e Federico Fellini foram três dos principais nomes do cinema italiano e mundial. Os três estiveram, em algum momento de suas carreiras, ligados ao Neorrealismo. Outros nomes fundamentais na criação do Neorrealismo Italiano são os de Cesare Zavattini, que foi o principal teórico do movimento, Luchino Visconti, Giuseppe De Santis e Michelangelo Antonioni.

No entanto, a maior parte dos filmes produzidos durante o regime Fascista eram puramente escapistas, mostrando a vida dos ricos, da burguesia italiana, da nobreza, não tendo qualquer semelhança com as condições de vida da imensa maioria dos italianos, que viviam na pobreza e na miséria, em meio a um ambiente de criminalidade, fome, abandono e prostituição.

Estes filmes eram como as novelas do horário nobre da 'Rede Globo', cujas tramas se passam na Barra da Tijuca, uma região habitada pelos ricos. Qualquer semelhança com os filmes da era fascista italiana não é mera coincidência. 

Estes filmes produzidos na época do Fascismo eram muito influenciados pela produção de Hollywood e eram chamados de ‘Telefone Bianchi’ (telefones brancos), pois branca era a cor dos telefones da burguesia, enquanto o povo italiano usava dos tradicionais telefones pretos. 



Na época do Fascismo, também eram realizadas muitas comédias leves e produções históricas. Alguns filmes até mostravam as paisagens naturais e o povo italiano (que são duas das principais características do Neorrealismo), mas isso era feito de forma idealizada, como se a vida dos italianos fosse uma verdadeira maravilha. 

O único filme produzido na época do Fascismo que chegou a mostrar a realidade das periferias de Roma (com toda a sua pobreza e desemprego) foi ‘Ragazzo’ (1933), de Ivo Perilli. 

Gino Costa (interpretado por Massimo Girotti) vivia de forma errante, fazendo trabalhos temporários e mal remunerados, por toda a Itália. Assim, 'Ossessione' mostrava uma realidade de pobreza que o regime Fascista procurava esconder da população italiana.

Em função disso, ou seja, de ser muito realista, o filme foi proibido pelo próprio Mussolini, que disse ‘Essas coisas não existem mais’, a respeito da pobreza e do desemprego que grassavam na Itália da época e que também foram mostrados em 'Ossessione'  (1943). 

Obs4: As informações sobre a proibição do filme ‘Ragazzoforam retiradas do livro ‘Mussolini’, de Pierre Milza, págs. 121-122, Editora Nova Fronteira. 


A trajetória de Luchino Visconti!

É bom ressaltar que
Luchino Visconti era um Conde, filho de um Duque, sendo um membro da Nobreza italiana, portanto.
Ele viveu muitos anos na França, onde conheceu o cineasta Jean Renoir, um dos expoentes do chamado ‘Realismo Poético Francês’, com quem trabalhou nos filmes ‘Toni’ (1935) e em 'Les Bas-fonds' (1936).

Neste seu ‘período francês’ Visconti se conectou ao PCF (Partido Comunista Francês). Retornando para a Itália, ele se ligou ao PCI (Partido Comunista Italiano), embora nunca tenha se filiado à legenda, ficando conhecido como o ‘Conde Vermelho’, devido ao seu marxismo declarado. 

Na Itália, Visconti passou a atuar na Resistência, chegando a ser preso pela Gestapo em 1943 (ele ficou três meses na prisão). Visconti também voltou a trabalhar com Jean Renoir, no filme ‘La Tosca’ e em 1940 ele passou a trabalhar na revista ‘Cinema’, dirigida por Vittorio Mussolini, o filho do ‘Duce’. 
Anna Magnani e Aldo Fabrizi foram dois dos maiores nomes do Cinema italiano e mundial e estão entre os principais nomes identificados com o Neorrealismo italiano.

‘Ossessione’ foi o primeiro filme de Visconti, tendo sido lançado em 1943. O filme gerou muita polêmica, pois mostrava uma realidade que o governo Fascista fazia de tudo para esconder, deixando claro que a Itália era um país pobre, com muitos problemas sociais, como o desemprego, a criminalidade e a prostituição. 

Consta que quando Vittorio Mussolini assistiu ao filme ele não gostou nenhum pouco do mesmo e teria dito 'Esta não é a Itália'. Em função disso, 'Ossessione' foi retirado de circulação poucos dias após o seu lançamento. 

Em uma entrevista de 1976 (ano em que veio a falecer) Visconti disse: “Prefiro contar as derrotas, descrever as almas solitárias, os destinos esmagados pela realidade”. 

Obs5: Estas informações foram retiradas do livro ‘O Cinema de... De Sica, Rossellini, Visconti, Antonioni e Fellini’, de Roberto de Castro Neves (págs. 47-50; Ed. Mauad X, 2012).

Nos anos seguintes à produção de ‘Ossessione’ tivemos a realização de uma série de filmes que se tornaram verdadeiros clássicos do Neorrealismo, do Cinema italiano e do Cinema Mundial.

Nesta relação nós podemos incluir ‘Roma, Cidade Aberta’ (1945), 'Paisà' (1946) e ‘Alemanha, Ano Zero’ (1948), três filmes dirigidos por Roberto Rossellini (constituem a chamada 'Trilogia da Guerra'), ‘Vítimas da Tormenta’ (1946) e 'Ladrões de Bicicleta' (1948), da dupla Vittorio de Sica-Cesare Zavattini, ‘A Terra Treme’ (1948), de Luchino Visconti, 'O Caminho da Esperança’ (Pietro Germi) e ‘Arroz Amargo’ (Giuseppe De Santis).

No entanto, cabe à 'Ossessione' a glória de ser considerado o filme que reuniu, pela primeira vez, todas as características fundamentais do Neorrealismo, embora não tenha alcançado a mesma popularidade de filmes fundamentais como 'Roma, Cidade Aberta' e 'Ladrões de Bicicleta'.
Cena de 'Paisà' (1946), de Roberto Rossellini, onde vemos Partigiani (guerrilheiros) que lutavam, na região norte da Itália, contra o Nazifascismo. A luta contra o Nazifascismo uniu forças políticas e sociais distintas no país, o que permitiu a formação de um governo de 'União Nacional', que existiu entre 1943-1947. O Neorrealismo surgiu e se desenvolveu justamente neste período, quando atingiu o seu auge.


As características do Neorrealismo Cinematográfico Italiano!

Entre algumas das principais características do Neorrealismo, nós temos:


- Uso de locações naturais, fora dos estúdios;


- Participação de pessoas comuns, que não eram atores, nos filmes, embora eles contracenassem com atores profissionais e consagrados;


- Trabalhadores e pessoas comuns como protagonistas dos filmes: camponeses, pescadores, operários, guerrilheiros;


- Mostrar a realidade social da Itália a partir de 1943, marcada por exploração dos trabalhadores, desemprego, miséria, fome, desigualdades sociais e regionais, criminalidade e prostituição em grande escala;


- Conscientizar e estimular os trabalhadores a levar adiante lutas sociais e políticas de caráter coletivo, procurando superar a situação de exploração e de miséria em que viviam;


- Produções de baixo orçamento;


- Fotografia num tom cinzento, granulado, o que é resultado da presença de elementos dos Documentários nos filmes Neorrealistas.


É bom ressaltar que nem todas as características acima estavam presentes nos filmes de forma isolada, mas elas coexistiam com outras bem diferentes e até opostas. Assim, atores profissionais e consagrados, como Anna Magnani e Aldo Fabrizi, trabalhavam junto com pessoas comuns, do povo, que não eram atores. 


E embora produções de baixo orçamento fossem a maioria, outras custaram bem mais caro e fizeram uso de características que estavam presentes nas grandes produções de Hollywood (planos gerais, grande número de figurantes, belas e sensuais atrizes, romances e histórias de crimes). E também existiram casos de filmagens que foram realizadas em estúdios. 
Cena de 'Alemanha Ano Zero' (1948), de Roberto Rossellini, filme que encerra a 'Trilogia da Guerra'. Rossellini fazia documentários antes de se tornar um dos principais cineastas do Neorrealismo e a influência dos mesmos fica clara em seus filmes. 
O contexto histórico no qual nasceu o Neorrealismo Italiano!

É bom ressaltar que o Neorrealismo Cinematográfico Italiano se desenvolveu devido à existência de um ambiente político e social altamente favorável, quando a Itália possuía um governo de
‘União Nacional’, que existiu entre 1943 e 1947, e que possuíam membros originários das forças Conservadoras (Democratas-Cristãos, Liberais, Monarquistas) e de Esquerda (Socialistas, Comunistas e Azionistas). 


E
ste governo de 'União Nacional' era formado pelos representantes dos vários segmentos políticos e sociais que lutaram contra o Nazifascismo (liberais, conservadores, democrata-cristãos, socialistas, comunistas).

Neste momento, existiam muitas esperanças de que a Itália pudesse caminhar na direção de algum tipo de Socialismo Democrático e com forte participação popular (operária e camponesa) no governo do país, pois os partidos Socialista (PSI; 21%)  e Comunista (PCI; 19%), somados, conquistaram 40% dos votos na primeira eleição democrática que foi realizada no país, em 1946.

Com isso, os cineastas do país que, em grande número, eram ligados ao PCI (Partido Comunista Italiano), desfrutaram de ampla liberdade criativa e puderam mostrar, em seus filmes, a realidade de pobreza, miséria, fome, exploração, desemprego, criminalidade e desigualdades sociais que caracterizavam a Itália do imediato Pós-Guerra.
'Anni Difficili' (1948), filme de Luigi Zampa que satiriza o Fascismo. Zampa fez vários filmes nos quais faz duras críticas ao Fascismo e, para isso, usa brilhantemente do humor e da sátira. Ele fez isso em outros filmes, como 'Vivere in Pace' (Viver em Paz; 1947) e 'Campane a Martello' (Toquem o Sino; 1949). 

Mas a partir de 1947 o cenário político e cultural europeu e italiano passou por grandes mudanças, que representaram um claro retrocesso em relação à situação imediatamente anterior, pois tivemos o início da Guerra Fria entre os EUA e a URSS. 

Desta maneira, os governos de ‘União Nacional’ que existiam em vários países europeus (Itália, França, Polônia, Hungria, Tchecoslováquia) chegaram ao fim.

Nos países do Leste Europeu tivemos a subida ao poder de governantes ligados aos interesses da União Soviética, enquanto que na Europa Ocidental tivemos a ascensão de governos conservadores e direitistas, inteiramente comprometidos com os interesses dos EUA. Isso resultou na divisão da Europa no Pós-Guerra em dois blocos: Capitalista, liderado pelos EUA; Socialista, liderado pela URSS.

Tal fenômeno aconteceu mesmo na França, onde os Comunistas (28%) e os Socialistas (26%) somaram, juntos, 54% dos votos, e também na Itália, onde esse percentual dos dois partidos de Esquerda chegou a 40%, como já comentei. 

No entanto, em 1948, na Itália, uma nova eleição deu ao PDC (Partido Democrata-Cristão) uma grande votação (48,5%), obtida graças ao apoio maciço da Igreja Católica, da Máfia, da Burguesia italiana (industriais, banqueiros, latifundiários) e do governo dos EUA, incluindo a CIA, que injetou milhões de dólares na campanha da conservadora Democracia Cristã, fato este que já foi devidamente comprovado, inclusive por documentos do governo dos EUA e da própria CIA. 
'Ladrões de Bicicleta' (1948): Filme de Vittorio De Sica incomodou o governo italiano, que tentou impedir que ele fosse exportado, dizendo que 'roupa suja se lava em casa'. O Neorrealismo italiano rompeu com o cinema que era realizado na época da Itália fascista, que produzia filmes escapistas, que mostravam a vida dos ricos (nobreza e burguesia) e escondia a situação de atraso e de pobreza do país.

E o novo governo conservador do PDC passou a criticar e a censurar os filmes dos cineastas Neorrealistas, afirmando que os mesmos mostravam uma imagem muito negativa da Itália. Inclusive, censores a serviço da Igreja Católica passaram a controlar a produção cinematográfica italiana, desestimulando a produção de filmes Neorrealistas e tentando convencer ou obrigar tais cineastas a fazer outro tipo de filme.

Para o governo do PDC (Partido Democrata Cristão) os filmes Neorrealistas eram obra de cineastas ligados ao PCI (Partido Comunista Italiano), o que é apenas parcialmente verdadeiro. Afinal, vários diretores ligados ao Neorrealismo nunca tiveram qualquer conexão com os Comunistas italianos, como eram os casos de Roberto Rossellini e de Pietro Germi, que eram católicos.

Em função desta política cada vez mais repressiva e de perseguição contra os cineastas Neorrealistas, até mesmo o clássico ‘Ladrões de Bicicleta’ (1948) chegou a ter o seu visto de exportação negado pelo governo conservador italiano. 

O líder Democrata-Cristão Giulio Andreotti, que era o responsável pelo setor cinematográfico do governo italiano, criticou duramente o filme de Vittorio De Sica, pois dizia que 'roupa suja se lava em casa', em função do fato de que 'Ladrões de Bicicleta' mostrava os problemas sociais urbanos da Itália do Pós-Guerra, como o desemprego, o trabalho precário, a pobreza e a infraestrutura urbana deteriorada. 
'Il Mulino del Po' (1949), dirigido por Alberto Lattuada, mostra a situação dos camponeses italianos, que viviam na miséria e entram em conflito com os latifundiários que os exploravam. No final da Segunda Guerra Mundial, a Itália ainda tinha a maioria da sua população vivendo na área rural e era analfabeta.

Na Itália do Pós-Guerra a bicicleta era um meio de transporte essencial, pois a pobreza da população e a precariedade dos serviços de transporte coletivo urbanos obrigavam as pessoas a usar a bicicleta como o principal meio de transporte, valorizando muito a mesma, o que explica o elevado número de roubos de bicicletas que aconteciam, bem como a existência de um mercado paralelo da mesma, o que é mostrado no filme de Vittorio De Sica. 

Mesmo assim 'Ladrões de Bicicleta' chegou a fazer muito sucesso no exterior e conquistou o Oscar de Melhor Filme estrangeiro em 1951. 

Para tirar espaço dos filmes Neorrealistas, o governo do PDC também estimulou a importação de filmes de Hollywood, que mostravam uma visão idealizada da realidade, e não exigia que um percentual mínimo de filmes italianos fosse exibido nas salas comerciais, tal como determinava a lei da época.

É neste contexto que os cineastas ligados ao Neorrealismo passaram a realizar filmes com um teor de crítica social mais ameno, passando a se utilizar do humor, da comédia, ou explorando a beleza física de atrizes como Silvana Mangano (em ‘Arroz Amargo’; 1949) e Lucia Bosé (em 'Páscoa Sangrenta'; 1950) em suas produções. 
"In Nome Della Legge" (1949), dirigido por Pietro Germi, deixa bem claro a marcante influência dos 'Westerns' de John Ford em sua obra. Germi era católico, defendia a autoridade do Estado e não compartilhava das ideias socialistas de outros cineastas Neorrealistas, como Visconti, De Santis e Lizzani. Porém, independente disso, ele construiu uma brilhante carreira, repleta de excelentes filmes. 

Estes dois filmes também faziam usos de grandes planos, típico do Cinema de Hollywood, e também contavam com um grande número de figurantes. Estes dois filmes, aliás, foram dirigidos por Giuseppe De Santis, um dos intelectuais marxistas que fez parte da equipe de críticos da revista 'Cinema' e do grupo que criou o Neorrealismo Cinematográfico Italiano.

Aliás, é bom ressaltar que os cineastas Neorrealistas tinham estilos muito diferentes entre si. Rossellini era fortemente influenciado pelo documentário, Luchino Visconti era um esteta, Vittório De Sica era o que realizava os filmes mais marcadamente emotivos. 

Enquanto isso, Giuseppe De Santis passou a fazer uso de recursos tipicamente hollywoodianos em seus filmes: planos gerais, grande número de figurantes, belas atrizes, histórias de romance e de crimes. Justificando essas mudanças em seus filmes, De Santis disse o seguinte: "Para mim, o realismo não exclui de modo algum a ficção, nem todos os meios classicamente cinematográficos".

Já o cineasta católico Pietro Germi, que nunca foi ligado ao PCI, também era bastante inflluenciado pelos filmes de John Ford e defendia a autoridade do Estado, vendo neste um papel civilizatório, que teria condições de impor a sua vontade contra a Máfia e os Latifundiários, recusando o apelo às lutas populares coletivas que eram defendidas por outros cineastas Neorrealistas (De Santis, Visconti, Lizzani). Essas concepções de Germi ficam bem claras em filmes como 'Il Camino della Speranza' (1950) e 'La Città si Difende' (1951). 

'La Terra Trema' (1948), de Luchino Visconti, trata da vida dos pescadores da Sicília, que falam na sua língua, foi um filme produzido sob encomenda do PCI (Partido Comunista Italiano) e deveria ter sido completado com mais dois filmes, sobre a vida dos mineiros e dos camponeses, mas eles não foram feitos. O filme trata da luta de classes envolvendo os pescadores sicilianos e os comerciantes que os exploram. A história do filme influenciou Glauber Rocha em 'Barravento' (1962).

Um dos melhores filmes Neorrealistas desta nova fase, que é 'Roma, Ore 11' (também dirigido por Giuseppe De Santis), também representava uma mudança de rumo nas produções dos cineastas Neorrealistas.

Afinal, embora o filme ainda trate e mostre as questões sociais mais relevantes do período, como a exploração dos trabalhadores e a pobreza ainda existente na Itália. Com isso, os filmes neorrealistas também passaram a mostrar romances e histórias de crime que afetavam a vida dos personagens. Aliás, Pietro Germi fez o mesmo em 'Il Cammino Della Speranza'.

Esta foi uma maneira que alguns cineastas Neorrealistas encontraram de promover uma atualização do Neorrealismo, visto que a denúncia social presente nas primeiras produções já tinha, praticamente, esgotado a sua contribuição para o Cinema italiano e o movimento já não tinha mais o prestígio e o alcance do início, além de passar a ser perseguido pelo governo direitista a partir de 1948. 

Até porque, aos poucos, o 'Plano Marshall' (1948-1953) começou a promover transformações na sociedade e na economia italiana e, assim, as condições de vida do povo italiano mudaram e melhoraram gradualmente. 

Portanto, a ideia de que seria possível melhorar de vida apenas se utilizando de métodos de luta coletivos e revolucionários vai perdendo força entre a população do país, o que também acabou se refletindo no cinema italiano.
'Sciùscia' (Vítimas da Tormenta; 1946), filme de Vittorio De Sica que mostra a exploração do trabalho infantil na Itália do Pós-Guerra. Seus filmes eram sempre feitos conjuntamente com Cesare Zavattini, que foi o principal teórico do Neorrealismo Italiano. A colaboração deles foi bastante produtiva e longeva, o que levou De Sica a continuar dirigindo filmes neorrealistas mesmo quando o auge do movimento já tinha passado.

Essa nova postura dos cineastas Neorrealistas deu origem ao que se convencionou chamar de ‘Neorrealismo Rosa’, que gerou filmes que combinavam a comédia com uma crítica social mais amena do que aquela que existiu na primeira fase do Neorrealismo. 

Um ótimo exemplo desta nova tendência é o belo filme ‘Le Ragazze di Piazza di Spagna’ (1952), de Luciano Emmer, que mostra a história de três jovens operárias que vivem na periferia de Roma e que sonham em melhorar de vida e que tentam isso por meio do trabalho duro, enquanto se envolvem em confusões e no qual temos a presença de um Marcello Mastroianni bem jovem (27 anos). Uma delas, interpretada pela belíssima Lucia Bosé, torna-se modelo e, assim, passa a desfrutar de uma vida melhor. 

Essas mudanças estão na origem das extremamente populares comédias italianas que fizeram muito sucesso a partir da segunda metade dos anos 1950 e durante e década de 1960, as quais sempre possuíam um elemento de crítica social e que se combinava com um humor inteligente e que era apreciado pelo público.  

Tais críticas eram feitas seja com relação às desigualdades sociais, bem como também criticavam os valores conservadores que predominavam no país, com várias comédias, por exemplo, satirizando o fato de que o divórcio era proibido na Itália em função da força imensa e das pressões da Igreja Católica no país (vide o clássico 'Divórcio à Italiana', de Pietro Germi, de 1961).
"Achtung! Banditi!" (1951): Filme dirigido por Carlo Lizzani, que sofreu com a censura do governo direitista italiano, que mostra a luta da Resistência contra o nazifascismo no norte da Itália, na região de Gênova. O filme não contou com ajuda do governo italiano e foi financiado por uma cooperativa de trabalhadores de Gênova, algo bastante raro no cinema mundial.

Estas comédias
contavam, para isso, com uma excepcional equipe de diretores, roteiristas, atrizes e atores, incluindo nomes como os de Mario Monicelli, Pietro Germi, Dino Risi, Marcelo Mastroianni, Federico Fellini, Vittorio De Sica, Sophia Loren, Virna Lisi, Monica Vitti, entre muitos outros profissionais e artistas de imenso talento. Logo, não foi à toa que as comédias italianas se tornaram tão populares pelo mundo afora. 

Também é importante chamar a atenção para o fato de que o
Neorrealismo Cinematográfico Italiano sofreu uma significativa influência de outros gêneros ou estilos cinematográficos, como foram os casos do cinema de Vanguarda Soviético dos anos 1920/30 (Sergei Einsenstein, Dziga Vertov, Vsevolod Pudovkin, Aleksandr Dovjenko), do Expressionismo Alemão, do Policial Noir e do Realismo Poético Francês. 

O Neorrealismo Italiano também exerceu, e isso ainda acontece, uma grande influência sobre todo o Cinema mundial, sendo que movimentos como a Nouvelle Vague, o Cinema Novo Brasileiro e o Cinema Iraniano estão entre aqueles que beberam na fonte do Neorrealismo.

No Brasil, os pioneiros em trazer as inovações do Neorrealismo Italiano foram Nelson Pereira dos Santos ('Rio, 40 Graus'; 1955), Roberto Santos ('O Grande Momento'; 1958) e Roberto Pires ('A Grande Feira'; 1961) e 'Barravento' (Glauber Rocha; 1962), sendo que eles acabaram, principamente os dois primeiros, se integrando ao movimento do Cinema Novo, cujo principal nome foi Glauber Rocha.
'Milagre em Milão' (1951), de Vittorio De Sica, mostra a luta de miseráveis italianos que ocupam uma propriedade particular na periferia de Roma e entram em conflito com o dono e com o governo da cidade, que fica ao lado dos capitalistas. O filme mostrava que mesmo as camadas populares já tinham absorvido os valores burgueses, como o individualismo e a ganância.

Os temas do Neorrealismo!

Segundo a pesquisadora Mariarosaria Fabris, entre os principais temas dos filmes Neorrealistas, nós temos:

A) O Fascismo, a Guerra e as suas consequências; 

B) A questão meridional (do Sul da Itália) e os problemas sociais no campo;

C) O desemprego e o subemprego urbanos;

D) O abandono dos jovens e idosos;

E) A condição da mulher;

F) A indagação psicológica e a relação do homem com a Religião;

G) A retomada dos temas do Antifascismo e da Guerra;

H) A elegia populista e a diluição da temática social;

I) A superação do Neorrealismo.
'Umberto D' (1952), de Vittorio De Sica, é o filme que muitos estudiosos do Neorrealismo consideram que colocou um fim ao movimento, mostrando que o mesmo já tinha se esgotado. Uma das soluções encontradas foi passar a usar do humor (Neorrealismo Rosa) e adotar técnicas das grandes produções de Hollywood, como fez Giuseppe De Santis em filmes como 'Riso Amaro' (1949) e 'Páscoa Sangrenta' (1950).

Relação de Filmes do Neorrealismo Italiano!

1) Ossessione (Luchino Visconti; 1943);

2) Roma, Cidade Aberta (Roberto Rossellini; 1945);

3) Giorni di Gloria (L. Visconti; G. De Santis; M. Serandrei; M. Pagliero; 1945);

4) Sciuscia (Vítimas da Tormenta; 1946);

5) Paisà (Roberto Rossellini; 1946);

6) Il Bandito (O Bandido; Alberto Lattuada; 1946);

7) Vivere in Pace (Luigi Zampa; 1946);

8) Delito (Alberto Lattuada; 1947);

9) Angelina, a Honorável (Luigi Zampa; 1947);

10) Caccia Tragica (Trágica Perseguição; Giuseppe De Santis; 1947);
'Cronaca di um Amore' (1950), com a belíssima Lucia Bosé como protagonista, foi o primeiro longa-metragem já mostrava uma mudança na trajetória de Michelangelo Antonioni, que era um Neorrealista quando fazia documentários. Seus longas-metragens passam a mostrar uma realidade diferente da Itália, acompanhando as mudanças econômicas e sociais que ocorriam no país, que foi reconstruído graças ao 'Plano Marshall'.

11) Juventude Perdida (Pietro Germi; 1948);

12) Alemanha, Ano Zero (R. Rossellini; 1948);

13) O Amor (R. Rossellini; 1948);

14) Sem Piedade (A. Lattuada; 1948);

15) A Terra Treme (Luchino Visconti; 1948);

16) Anni Difficili (Luigi Zampa; 1948);

17) É Proibido Roubar (Luigi Comencini; 1948);

18) Ladrões de Bicicleta (Vittorio De Sica; 1948);

19) Em Nome da Lei (Pietro Germi; 1949);

20) Arroz Amargo (Giuseppe De Santis; 1949);
'Riso Amaro' (1949), dirigido por Giuseppe De Santis, é um filme que faz uso de grandes planos gerais e de centenas de figurantes, bem como da beleza de Silvana Mangano, mostrando a influência de Hollywood sobre o Neorrealismo italiano. De Santis justificou isso como forma de garantir a sobrevivência do cinema neorrealista, pois os filmes de Hollywood eram muito populares na Itália e recebiam proteção do governo do país.

21) Campane a Martello (Luigi Zampa; 1949);

22) O Moinho do Pó (Alberto Lattuada; 1949);

23) Stromboli (Roberto Rossellini; 1950);

24) Domingo de Agosto (Luciano Emmer; 1950);

25) Páscoa Sangrenta (Giuseppe De Santis; 1950);

26) Crônica de um Amor (Michelangelo Antonioni; 1950);

27) O Drama da Linha Branca (Luigi Zampa; 1950);

28) O Caminho da Esperança (Pietro Germi; 1950);

29) Mulheres e Luzes (F. Fellini e A.Lattuada; 1950);

30) Milagre em Milão (Vittorio De Sica; 1951);
'Le Ragazze di Piazza di Spagna' (Luciano Emmer; 1952) é uma ótima comédia que mesclou elementos do Neorrealismo original (mostrar a vida de trabalhadoras pobres das periferias urbanas) com o humor, dando origem ao que se chamou de 'Neorrealismo Rosa'.

31) Janelas Fechadas (Luigi Comencini; 1951);

32) A Cidade se Defende (Pietro Germi; 1951);


33) Achtung! Banditi! (Carlo Lizzani; 1951);


34) Ana (Alberto Lattuada; 1951);


35) Belíssima (Luchino Visconti; 1951);


36) Umberto D. (Vittorio De Sica; 1952);


37) Le Ragazze di Piazza di Spagna (Luciano Emmer; 1952);


38) Roma às 11 Horas (Giuseppe De Santis; 1952);


39) O Capote (Alberto Lattuada; 1952);


40) Europa 51' (Roberto Rossellini; 1952);

Anna Magnani em cena de 'Mamma Roma' (1962), que foi o segundo longa-metragem de Pier Paolo Pasolini. O filme tinha elementos do Neorrealismo original, mas foi realizado em um período posterior (anos 1960). Nesta época, muitos cineastas italianos retomaram os temas do Neorrealismo original, gerando o chamado 'Pós-Neorrealismo'. 

41) Abismo de um Sonho (Federico Fellini; 1952);

42) Mercado de Mulheres (Luigi Comencini; 1952);

43) A Provinciana (Mario Soldati; 1953);

44) A Dama Sem Camélias (M. Antonioni; 1953);

45) Stazione Termini (Vittorio De Sica; 1953);

46) Coração de Mulher (Giuseppe De Santis; 1953);

47) I Vitelloni (Os Boas Vidas; Federico Fellini; 1953);

48) Nós, as Mulheres (R. Rossellini; L. Visconti; L. Zampa; G. Franciolini; A. Guarini; 1953);

49) Amores na Cidade (M. Antonioni; F. Fellini; A. Lattuada; C. Lizzani; F. Maselli; D. Risi; C. Zavattini; 1953);

50) Pão, Amor e Fantasia (Luigi Comencini; 1953);
'Rio, 40 Graus' (1955), filme dirigido por Nelson Pereira dos Santos, foi fortemente influenciado pelo Neorrealismo Italiano. Essa influência também estará presente no movimento do Cinema Novo brasileiro.

51) Os Amantes de Florença (Carlo Lizzani; 1954);

52) A Romana (Luigi Zampa; 1954);

53) Senso (Luchino Visconti; 1954);

54) La Strada (F. Fellini; 1954);

55) O Medo (R. Rossellini; 1954);

56) Pão, Amor e Ciúme (L. Comencini; 1954);

57) O Ouro de Nápoles (Vittorio De Sica; 1954);

58) Gli Sbandati (Francesco Maselli; 1955);

59) Il Bidone (F. Fellini; 1955);

60) O Ferroviário (Pietro Germi; 1956);
Mariarosaria Fabris escreveu aquele que é o único livro brasileiro sobre o Neorrealismo Cinematográfico Italiano.

61) O Teto (Vittorio De Sica; 1956);


62) O Grito (Michelangelo Antonioni; 1957);

63) La strada lunga un anno (Giuseppe De Santis; 1958).

Links:

História do Festival de Veneza:
https://pt.wikipedia.org/wiki/Festival_Internacional_de_Cinema_de_Veneza

Ossessione (Luchino Visconti):
https://cultsecinefilos.blogspot.com/2019/03/ossessione-baseado-em-romance-policial.html


Roma, Cidade Aberta (Roberto Rossellini):


Alemanha Ano Zero (Roberto Rossellini):

Ladrões de Bicicleta (Vittorio De Sica):

Il Camino dela Speranza (Pietro Germi):
https://cultsecinefilos.blogspot.com/2019/12/il-cammino-della-speranza-pietro-germi.html

'Vivere in Pace' (Luigi Zampa):
https://cultsecinefilos.blogspot.com/2019/07/vivere-in-pace-e-uma-bela-comedia-neo.html

Sciùscia (Vítimas da Tormenta; Vittorio De Sica):
https://cultsecinefilos.blogspot.com/2019/06/sciuscia-vitimas-da-tormenta-mostra-as.html

In Nome dela Legge (Pietro Germi):
https://cultsecinefilos.blogspot.com/2019/05/in-nome-della-legge-homenageando-o.html

La Città si Difende (Pietro Germi):
https://cultsecinefilos.blogspot.com/2019/05/la-citta-si-difende-pietro-germi-fez-um.html

Páscoa Sangrenta (Giuseppe De Santis):
https://cultsecinefilos.blogspot.com/2019/05/pascoa-sangrenta-giuseppe-de-santis.html

Milagre em Milão (Vittorio De Sica):
https://cultsecinefilos.blogspot.com/2019/05/milagre-em-milao-de-sica-mostra-o.html

Umberto D (Vittorio De Sica):
https://cultsecinefilos.blogspot.com/2019/05/umberto-d-de-sica-homenageia-o-pai-em.html

Riso Amaro (Giuseppe De Santis):
https://cultsecinefilos.blogspot.com/2019/04/riso-amaro-arroz-amargo-um-classico-do.html

Cronaca di un Amore (Michelangelo Antonioni):
https://cultsecinefilos.blogspot.com/2019/06/cronaca-di-un-amore-influenciado-pelos.html

Europa 51' (Roberto Rossellini):
https://cultsecinefilos.blogspot.com/2019/04/europa-51-rossellini-mistura-marxismo-e.html

Achtung! Banditi! (Carlo Lizzani):
https://cultsecinefilos.blogspot.com/2019/02/achtung-banditi-classico-do.html

O Grito (Michelangelo Antonioni):
https://cultsecinefilos.blogspot.com/2019/02/o-grito-filme-mostra-transicao-do-neo.html

Gli Sbandati (Os Refugiados; Francesco Maselli):
https://cultsecinefilos.blogspot.com/2019/03/gli-sbandati-os-refugiados-e-um-belo.html

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