'Rosa Luxemburgo': Um belo filme que mostra a trajetória de uma revolucionária influente e respeitada até por seus inimigos! - Marcos Doniseti!

'Rosa Luxemburgo': Um belo filme que mostra a trajetória de uma revolucionária influente e respeitada até por seus inimigos! - Marcos Doniseti!

'Rosa Luxemburgo' (1986): Filme brilhante da cineasta Margarethe von Trotta, que conta com uma fantástica interpretação de Barbara Sukowa.

"A realização da sociedade socialista é a mais grandiosa tarefa que, na história do mundo, já coube a uma classe e a uma revolução. Essa tarefa exige uma completa transformação do Estado e uma completa mudança dos fundamentos econômicos e sociais da sociedade. Essa transformação e essa mudança não podem ser decretadas por nenhuma autoridade, comissão ou Parlamento: só a própria massa popular pode empreendê-las e realizá-las.". 

Rosa Luxemburgo, em 'O Que Quer a Liga Spartakus' (1918), do livro 'Rosa Luxemburgo e o Protagonismo das Lutas de Massa', Isabel Loureiro (org.), pág. 183. 

Sinopse!

O filme conta a história de vida de Rosa Luxemburgo, que foi uma importante líder política, intelectual e revolucionária de origem polonesa e que também adotou a nacionalidade alemã. Ela nasceu em uma pequena cidade polonesa (05/03/1871) e morreu em Berlim (15/01/1919). 

O filme desmonta totalmente a ideia estúpida, mas que era bastante divulgada, de que Rosa Luxemburgo teria sido uma revolucionária sanguinária. 

Rosa Luxemburgo (interpretada por Barbara Sukowa) sendo interrogada na prisão polonesa, em 1906.

De fato, o filme comprova que essa era uma visão falsa sobre Rosa Luxemburgo, o que se comprovou após uma minuciosa pesquisa sobre a sua vida que foi feita pela diretora, Margarethe von Trotta, e pela excepcional atriz que a interpreta, Barbara Sukowa.

O filme engloba todos os principais momentos da vida de Rosa, iniciando-se com o momento em que ela está presa na Polônia, em 1906, devido à sua participação na Revolução Russa de 1905-1906. 

Depois, vemos a sua ida para a Alemanha, onde irá se integrar ao SPD, maior partido de origem operária do mundo, as suas discordâncias com os dirigentes do partido, a sua postura antiguerra, que a levou à prisão, de onde saiu com a saúde debilitada.

Também vemos a participação de Rosa na Insurreição Espartaquista (apesar de Rosa não ter sido avisada de que ela iria acontecer e de se colocar contra a sua realização naquele momento) e a sua morte (junto com a do outro líder da Insurreição, Karl Liebknecht) em função da derrota desta tentativa revolucionária, o que aconteceu em 15 de Janeiro de 1919.

A produção de 'Rosa Luxemburgo'! 

 Barbara Sukowa e Margarethe von Trotta estão entre os maiores nomes do cinema europeu.

'Rosa Luxemburgo' (1986) é um belíssimo filme, que foi dirigido por Margarethe von Trotta, brilhante cineasta alemã que foi revelada pelo Novo Cinema Alemão, movimento cinematográfico que se desenvolveu durante a década de 1960.

O Novo Cinema Alemão teve início com o 'Manifesto de Oberhausen', de 28 de Fevereiro de 1962, atingiu o seu auge, criativo e comercial, durante a década de 1970, com a consagração internacional de vários dos seus principais cineastas.

Os nomes mais significativos do movimento foram Rainer W. Fassbinder, Wim Wenders, Werner Herzog, Volker Schlondorff, Alexander Kluge, Edgar Reitz e, é claro, a própria Margarethe von Trotta.

Margarethe von Trotta começou a sua carreira como atriz, trabalhando em filmes dessa nova geração de cineastas, como 'Baal' (Volker Schlondorff; 1970) e 'Deuses da Peste' (Fassbinder; 1970). 

Posteriormente, Margarethe tornou-se uma talentosa cineasta, que dirigiu excelentes filmes, incluindo também 'Os Anos de Chumbo' (1981) 'Heller Wahn' (1983) e 'Hannah Arendt' (2012).

Box da 'Obras Primas do Cinema' reúne 3 excelentes filmes da talentosa cineasta Margarethe von Trotta, que são 'Rosa Luxemburgo' (1986), 'Os Anos de Chumbo' (1981) e 'A Honra Perdida de Katharina Blum' (1975). 

Margarethe von Trotta também foi diretora, junto com o seu então marido, Volker Schlondorff, de 'A Honra Perdida de Katharina Blum' (1975), o que foi o seu primeiro trabalho dirigindo.

Ela ficou conhecida, principalmente, por realizar filmes que sempre trataram de questões históricas e que são protagonizadas por mulheres, pois a cineasta se tornou uma importante defensora do Feminismo. Margarethe von Trotta está com 80 anos e continua na ativa.

Assim, 'Die Bleierne Zeit' ('Os Anos de Chumbo'; 1981) reflete criticamente sobre o período turbulento que a então Alemanha Ocidental  vivenciou nos anos 1970, no qual um grupo de Extrema Esquerda, a 'RAF' (Rote Armee Fraktion; Fração do Exército Vermelho) atuou no sentido de derrubar o regime capitalista e implantar o Socialismo por meio de ações de guerrilha urbana.

O 'Rote Armee Fraktion' foi fundado em 1970, que ficou mais popularmente conhecido como Grupo Baader-Meinhof, promoveu inúmeras ações violentas contra defensores e símbolos do Capitalismo e do Estado alemão nos anos 1970 (incluindo empresas privadas, polícia, órgãos públicos, etc). O 'RAF' se descrevia como um grupo de guerrilha urbana comunista e anti-imperialista. 

Rosa Luxemburgo, líder política, intelectual respeita e revolucionária, nascida na Polônia (1871), quando a mesma fazia parte do Império Czarista, e Karl Liebknecht, nascido na Alemanha, em 1871.

A trama de 'Os Anos de Chumbo' (que Ingmar Bergman escolheu como um dos seus 11 filmes favoritos de todos os tempos) conta essa história sob a perspectiva de duas irmãs (Marianne e Juliane), filhas de um rigoroso pastor protestante, que quando atingem a idade adulta tornam-se ativistas políticas, mas que tomam rumos distintos. 

Assim, enquanto Marianne entra para um grupo guerrilheiro de Extrema Esquerda (que embora não seja identificado como o RAF, é claramente referenciado como tal), Juliane entra para um grupo feminista que defende os direitos das mulheres, lutando pela legalização do direito ao aborto.

Margarethe von Trotta fez uma imensa pesquisa para poder realizar esse belo filme que é 'Rosa Luxemburgo' (1981). 

Ela disse que ficou dois anos inteiros lendo sobre a vida de Rosa Luxemburgo e chegou a entrevistar duas pessoas, já com idade avançada (com cerca de 90 anos), mas ainda lúcidas, que conheceram a própria Rosa. Uma delas foi aluna de Rosa na 'Escola de Quadros' do SPD e outro foi um anarquista. 

As histórias que eles contaram foram, depois, usadas no filme, como o fato de que Rosa almoçava com o seu gato (Mimi) à mesa, como se ele fosse humano.  

'A Bandeira Vermelha': Jornal oficial do Partido Comunista Alemão (KPD), edição de Novembro de 1918, quando aconteceu a Revolução Democrática que derrubou a Monarquia e transformou a Alemanha em uma República Parlamentarista. Além disso, o novo governo, liderado pelo SPD, reconheceu o direito de voto para as mulheres, adotou a jornada de 8 horas diárias e convocou eleições para uma Assembleia Constituinte, que foram realizadas em Janeiro de 1919.

Margarethe também procurou conhecer profundamente a obra e a vida pessoal dessa brilhante revolucionária internacionalista e marxista, chegando a ler cinco vezes todas as cartas escritas por Rosa, bem como procurou conhecer toda a obra teórica da revolucionária e também saber tudo sobre a trajetória política de Rosa. 

Desta maneira, Margarethe disse que Rosa era uma mulher vibrante e cheia de energia e que tinha a capacidade de cativar as pessoas, mesmo aquelas que discordavam politicamente dela.

É bom ressaltar que Rosa sempre defendeu que a classe trabalhadora deveria promover a Revolução Socialista, o que a levou a entrar em conflito e a romper, em 1916, com o Partido Social Democrata alemão (SPD), cujos líderes (Bebel, Kautsky, Bernstein, Auer...) preferiam atuar dentro das regras da Democracia Liberal, priorizando as lutas no Parlamento como o melhor meio para se chegar ao Socialismo.

Assim, Margarethe conseguiu, em seu filme, mostrar não apenas a Rosa que foi uma importante liderança política e revolucionária, mas também a Rosa mulher, que tinha o desejo de viver a vida de maneira plena. 

Ela disse que a leitura das cartas escritas por Rosa lhe permitiu descobrir muito mais da Rosa mulher e não apenas da revolucionária e teórica. Foi assim que ela descobriu que Rosa, por exemplo, amava a natureza e os animais. 

Rosa Luxemburgo discursa em manifestação.

A cineasta também disse que, originalmente, o projeto de fazer um filme sobre Rosa Luxemburgo era de Fassbinder, que já tinha preparado tudo para começar a filmar, já possuindo um roteiro finalizado inclusive, mas a morte precoce do genial cineasta, em 10 de Junho de 1982, inviabilizou, é claro, a realização do projeto. 

Depois, Margarethe von Trotta conversou com o produtor do projeto de
Fassbinder (Hanns Eckelkamp) e o mesmo concordou que ela era o melhor nome para dirigir o filme sobre Rosa Luxemburgo. Mas a cineasta deixou claro que iria elaborar um novo roteiro, com base em suas próprias ideias e conhecimento a respeito da revolucionária que tinha dupla nacionalidade, polonesa e alemã. 

Margarethe também disse que chegou a conversar com Fassbinder a respeito do seu interesse em filmar a vida de Rosa e que o cineasta a incentivou, independente do fato de que ele também queria fazer o mesmo. Margarethe disse, no entanto, que a ideia dela era fazer uns 10 filmes antes de filmar a vida de Rosa, para ganhar mais experiência.

A cineasta teve muita dificuldade, inicialmente, para encontrar a atriz ideal para interpretar Rosa, pois ela procurou por alguém que fosse fisicamente parecida com a revolucionária e que também fosse uma boa atriz, mas que não encontrou ninguém na Polônia que preenchesse esses requisitos.

Leo Jogiches que fundou o Partido Social Democrata da Polônia, em 1893, junto com Rosa Luxemburgo, Julian Marchlewski e Adolf Warski. Leo e Rosa foram aliados políticos a vida toda.

Depois, ela contou com a ajuda da atriz polonesa Barbara Sukowa, que estava nos EUA, para encontrar essa atriz. Porém, Margarethe acabou decidindo pela própria Barbara, que pouco se parece com Rosa fisicamente, mas que é uma atriz de imenso talento e que soube transmitir perfeitamente a energia e a inteligência ferina de Rosa. 

A própria Barbara Sukowa, quando ouviu a proposta de Margarethe para interpretar Rosa, pensou que a cineasta estivesse louca. Porém, quando se preparou para o papel, ela descobriu que Rosa Luxemburgo era uma mulher imensamente inteligente, dotada de uma moralidade profunda e que era uma grande personalidade. 

Barbara disse também que 'você não sente que pode ocupar o seu lugar', que ficou muito ansiosa com isso e que foi muito corajosa ao aceitar esse papel, além de ter sido muito gratificante e que, de certa forma, 'se apaixonou por Rosa'. 

Barbara Sukowa também afirmou que um roteiro não é o suficiente para permitir que se possa 'entrar em um papel', pois 'o papel não existe, existe apenas o roteiro', sendo que isso não é suficiente para saber 'que tipo de pessoa você deseja retratar'. 

Rosa Luxemburgo escreveu muitas cartas durante toda a sua vida. A sua correspondência foi estudada por Margarethe e Barbara Sukova na realização do filme.

Assim, o fato dela ter tido acesso a uma grande quantidade de material sobre Rosa (biografias, cartas, as teorias políticas...) lhe permitiu saber muito mais sobre a pessoa, como que tipo de comida ela gostava, como ela se sentia em relação ao seu gato, as roupas que usava, sobre seus amores entre muitas outras informações que ela usou para compor a personagem, influenciando muito nas filmagens. 

Barbara também afirmou que ficou muito feliz com o sucesso conquistado pelo filme, pois permitiu que Rosa Luxemburgo fosse reabilitada, pois antes do filme muitas pessoas pensavam nela apenas como 'Rosa, a comunista sanguinária', sendo que ela não era nada disso, sendo uma pessoa muito poética e que possuía uma alma sensível. 

Barbara disse que Rosa Luxemburgo era uma mulher muito à frente do seu tempo, que queria tudo: trabalhar, ter uma carreira e filhos, se apaixonar, amar, casar, ter experiências intelectuais. E Barbara conclui dizendo que 'Mas ela queria tudo, era incrível', embora fosse muito difícil conquistar tudo o que Rosa conseguiu.

Ainda bem que Barbara Sukowa aceitou interpretar Rosa Luxemburgo, pois a sua atuação é soberba, fantástica e não se consegue imaginar outra atriz melhor para se fazer um trabalho tão grandioso.

Rosa Luxemburgo foi presa na Polônia czarista por sua participação na Revolução Russa de 1905. Ela foi uma líder revolucionária, mas sempre disse que a Revolução aconteceria apenas se o proletariado tomasse essa decisão.

Margarethe von Trotta, por sua vez, também afirmou que a ideia dela, inicialmente, era filmar em Berlim, mas em função da Segunda Guerra Mundial, quando a cidade foi fortemente bombardeada e devastada, havia poucos lugares que se pareciam com aqueles locais em que a vida de Rosa transcorreu. 

Assim, ela fez metade das filmagens em Praga, na então Tchecoslováquia, pois ali ainda existiam tais lugares (restaurantes, salões, bares...), pois o país não sofreu tanto com a Guerra, quando comparado com outros países da Europa Central (Alemanha, Polônia, Hungria). 

Margarethe von Trotta também disse que a Alemanha atual começou no início do século XX, quando Rosa Luxemburgo se tornou uma das grandes líderes políticas e revolucionárias da época.

O filme de Margarethe também procurou sintetizar, em apenas duas horas, cerca de 20 anos da vida e da obra de Rosa Luxemburgo, bem como dos principais acontecimentos históricos do período. 

Leo Jogiches e Rosa Luxemburgo se reencontram depois que ela foi libertada da prisão na Polônia czarista, graças ao pagamento de uma fiança por parte do SPD.

Em função disso, não foi possível se aprofundar nos complexos assuntos e acontecimentos que são tratados no filme, como o conflito interno que ocorreu no SPD (Partido Social Democrata) em torno do tema da Revolução Socialista. 

A Revolução Socialista era rejeitada pela imensa maioria dos seus líderes, que priorizavam as lutas no Parlamento, mas que era ardentemente defendida por Rosa Luxemburgo e Karl Liebknecht. 

Essa síntese foi realizada de maneira bastante competente e muito fiel aos acontecimentos pela cineasta, mas isso também obriga a que os espectadores procurem se informar, por outros meios (livros, documentários, debates e textos disponíveis na Internet), a respeito desses temas.

Sem fazer isso, quem não conhece a história de vida de Rosa e a trajetória do SPD alemão acabará não conseguindo compreender de forma minimamente satisfatória o que está sendo mostrado no filme.

Obs: As declarações de Margarethe von Trotta e de Barbara Sukowa foram retiradas de duas entrevistas que constam no belíssimo DVD lançado pela 'Obras-Primas do Cinema' e no qual temos três fantásticos filmes da brilhante cineasta alemã, que são 'A Honra Perdida de Katharina Blum' (1975), 'Os Anos de Chumbo' (1981) e, é claro, 'Rosa Luxemburgo (1986)'. 

A história do filme!

Rosa e Leo Jogiches, já na Alemanha, obrigam um jornal a publicar um texto que contrariava as ideias do proprietário. Afinal, a liberdade de imprensa não é para todos.

A história de Rosa Luxemburgo é contada usando-se de idas e voltas no tempo. Então, o filme alterna diferentes períodos da vida da líder política e revolucionária, mostrando a sua origem na Polônia, onde nasceu (em 05/03/1871), que na época era um país dominado pela Rússia Czarista, um vasto império que englobava terras do Leste Europeu até o Extremo Oriente.

O início do filme mostra Rosa Luxemburgo em uma prisão polonesa, que ocorreu devido à sua intensa participação na chamada Revolução de 1905, entre Dezembro de 1905 e Março de 1906, quando foi presa, junto com Leo Jogches. 

Esta Revolução se desenvolveu na Rússia Czarista e envolveu inúmeros territórios do Império, incluindo a Polônia. Ela foi libertada em Junho de 1905, quando o SPD alemão pagou a sua fiança.

Posteriormente, Rosa também será condenada, pela Justiça da Alemanha Imperial, pelo fato de ter se colocado totalmente contrária à participação do país na Primeira Guerra Mundial, pois ela dizia que essa guerra iria beneficiar apenas ao Grande Capital e representaria a morte de milhões de operários que iriam matar uns aos outros. 

Assim, a guerra representaria a negação da política adotada pela Segunda Internacional, de unir os trabalhadores do mundo todo para construir uma sociedade justa, igualitária, democrática, ou seja, Socialista.

Leo Jogiches e Rosa Luxemburgo tiveram um romance que durou 15 anos, mas que chegou ao fim quando ela descobriu o envolvimento dele com outra mulher. O filme desmontou a visão que predominava de Rosa até aquele momento, de uma pessoa fria e sanguinária.

É bom ressaltar que essa política não era apenas dela, Rosa, mas da chamada Segunda Internacional, que foi criada em Julho de 1889, por iniciativa de Engels, e que reunia partidos de origem operária e de orientação Socialista de inúmeros países: Alemanha, França, Áustria, Bélgica, Polônia, Itália, entre outros.

A Primeira Guerra Mundial acabou dividindo a Segunda Internacional, que chegou ao fim em 1916.

Também vemos cenas que mostram a infância de Rosa que, desde a mais tenra idade, gostava muito de ler e de escrever, enviando muitas cartas para seus primos. Ela também ajudou, mesmo quando criança, uma empregada da sua família para que aprendesse a ler. Rosa também gostava muito dos animais e era muito apegada a um gato (Mimi), que jantava junto com ela.

O filme também mostra que Rosa também procurou se aproximar das agentes encarregadas das suas atividades na prisão, oferecendo livros para uma delas (Elisabeth). Essa sua capacidade de fazer amizades fez com que ela fosse transferida com frequência de uma prisão para outra. Até a sua libertação ela cumpriu pena em 9 prisões diferentes.

Rosa Luxemburgo e Clara Zetkin, duas marxistas, foram amigas e aliadas políticas durante a vida inteira. Clara era alemã, tendo nascido em 1857, e foi uma pioneira do Feminismo. O Dia Internacional da Mulher surgiu a partir de uma proposta de Clara, que foi apresentada na Segunda Conferência Internacional das Mulheres Socialistas, realizada em agosto de 2010, em Copenhague.

O filme também mostra a vida amorosa de Rosa, que inicialmente se envolveu com Leo Jogiches (nascido em Vilnius, capital da Lituânia), que foi o fundador, em 1893, e principal líder do Partido Social Democrata da Polônia e Lituânia (o nome correto era Social Democracia do Reino da Polônia e Lituânia). 

Depois, quando ela descobriu que ele havia se envolvido com outra mulher, Rosa decidiu por colocar fim ao relacionamento amoroso com ele (que rejeitava o fim do relacionamento), que durou 15 anos, embora continuassem atuando política e intelectualmente juntos nos mesmos partidos (Social Democratas), na Polônia e na Alemanha. 

Depois disso, Rosa irá se envolver com Kostja, que era filho de Clara Zetkin. Este relacionamento irá durar até 1912. Em 1914, Kostja foi convocado para lutar pelo Exército alemão. Kostja sobreviveu à guerra, concluiu os seus estudos em Medicina e faleceu em 1980, aos 95 anos, no Canadá.

Além de atuarem na Social Democracia polonesa, os dois também irão atuar, principalmente Rosa, no Partido Social Democrata alemão (SPD). Rosa chegou a fazer um casamento de fachada, em 1898, com um alemão chamado Gustav Lubeck, com o objetivo de obter a cidadania alemã.

Karl Kautsky e Leo Jogiches se cumprimentam durante a festa de Ano Novo de 1900. Nessa época o SPD estava em franco processo de crescimento e havia muito otimismo de que isso continuaria.

E a partir de 1898 Rosa irá entrar para o SPD e se tornará uma liderança importante e bastante próxima dos líderes mais relevantes do partido, como Karl Kautsky, August Bebel, Erhard Auer, Clara Zetkin, Eduard Bernstein e Friedrich Ebert. 

Já em 1899 ela trava uma polêmica com Eduard Bernstein sobre reforma e revolução, o que a tornou conhecida e respeitada entre os membros do SPD. O SPD era o maior partido de origem operária do mundo e que sempre conquistava o maior número de votos nas eleições para o Reichstag (o Parlamento alemão), o que aconteceu entre 1890 e 1930. 

Como é dito por Rosa, no filme, foi justamente por isso que ela tomou a iniciativa de desenvolver as suas atividades políticas no SPD alemão e não no polonês, que era um partido bem mais fraco.

Porém, antes da Revolução Democrática de Novembro de 1918, não era o Parlamento alemão que governava, pois ele tinha poucos poderes. O Poder Executivo era exercido por um Chanceler, que era escolhido pelo Imperador, e o Parlamento pouco influenciava nas decisões do governo.

Rosa Luxemburgo conversa com Karl Kautsky, o principal teórico do SPD, que foi um dos responsáveis por atualizar o programa do partido, em 1891, quando foi adotado o Programa de Erfurt, elaborado por Kautsky, junto com August Bebel e Eduard Bernstein. O Programa de Erfurt substituiu o Programa de Gotha, adotado na fundação do SPD, em 1875, e cujas ideias dominantes eram as de Ferdinand Lassale.

Porém, após o seu retorno da Rússia czarista, no segundo semestre de 1906, Rosa se tornou mais radical em suas posturas políticas, publicando um texto defendendo ideias revolucionárias, que foi o 'Greve de massas, partido e sindicatos'.

Assim, Rosa pressiona os principais líderes do SPD (August Bebel, Karl Kautsky, Erhard Auer, Eduard Bernstein) para que eles se comprometessem com a ideia de se promover uma Revolução Socialista na Alemanha, o que eles rejeitavam totalmente, o que ficou bem evidente durante o Congresso Social Democrata de Mannheim, realizado entre 23 e 29 de Setembro de 1906.

Essa rejeição da via revolucionária se devia ao fato de que, a cada eleição para o Parlamento alemão, a votação do SPD crescia. Assim, a votação do SPD teve a seguinte evolução: 

1877: 9,1%; 1884: 9,7%; 1890: 19,7%; 1898: 27,2%; 1913: 34,8%; 1919: 37,9%.

Assim, na visão dos líderes do SPD, não fazia sentido que o partido liderasse uma Revolução Socialista se, a cada década a votação da legenda crescia cada vez mais e, logo, o SPD caminhava para, em algum momento, se tornar o partido governante da Alemanha, o que acabará acontecendo no final de 1918, após a vitória da Revolução Democrática e Republicana. 

Louise Kautsky, que era casada com Karl, e Rosa tornaram-se grandes amigas. Elas evitavam falar sobre questões políticas, mas durante a prisão de Rosa, na época da Primeira Guerra Mundial, elas acabaram se afastando justamente devido às diferenças políticas entre Rosa e Karl, que haviam rompido em 1910, quando Kautsky recusou-se a apoiar a defesa da adoção da República, que era defendida por Rosa. 

Enquanto isso, na Rússia Czarista o contexto era totalmente diferente, pois sequer existia um Parlamento digno do nome (a Duma, criada depois da Revolução de 1905, mal se reunia e não possuía nenhum poder real), as eleições eram raras, a imprensa era censurada e o regime czarista era brutalmente repressivo.

O regime czarista promovia brutais repressões militares, enchia as prisões do Império com milhares de pessoas, enquanto muitos outros eram exilados (interna e externamente), o que acontecia frequentemente com os principais líderes da oposição.

Assim, enquanto na Rússia Czarista, líderes da oposição (Lenin, Trotsky, Martov, Stalin...) amargaram longos períodos de prisão e de exílio, os principais líderes do SPD alemão atuavam abertamente, sem medo de serem presos ou exilados. 

O filme mostra um progressivo afastamento de Rosa, bem como de Leo Jogiches e Karl Liebknecht, das ideias e políticas adotadas pela liderança do SPD. O auge deste processo se dá quando da votação dos créditos de guerra, em agosto de 1916, para que o governo da Alemanha Imperial pudesse travar a guerra. 

Barbara Sukowa desempenha de forma brilhante uma Rosa Luxemburgo que era uma mulher completa: professora, intelectual, teórica, escritora, líder política e revolucionária, que amava os animais, teve suas paixões e queria ser mãe.

Quase todos os deputados do SPD no Parlamento foram favoráveis aos créditos. Isso também aconteceu com quase todos os partidos da Segunda Internacional (fundada em Julho de 1889), o que era contraditório com todo o programa que haviam defendido nas décadas anteriores, frontalmente contrário às guerras imperialistas.

O principal argumento usado pelos deputados do SPD por terem votado a favor dos créditos de guerra é que a imensa maioria dos operários alemães apoiava essa medida. De fato, quando a Primeira Guerra Mundial começou, a população de todos os países envolvidos (Rússia, Alemanha, Grã-Bretanha, França, Áustria-Hungria) apoiou o início da guerra. 

Inegavelmente, a oposição à guerra era bem reduzida em seu início. Até porque todos os povos estavam convencidos de que a guerra teria curta duração e que seus países seriam vitoriosos. Logo, esperava-se que a guerra não iria gerar tantas mortes e destruição quando aquelas que, de fato, acabaram acontecendo.

Somente a partir de 1917 é que os povos de vários países (Rússia e Alemanha, em especial) vão começar a se opor à continuidade da guerra, devido ao grande números de mortos e ao fato de que a economia estava se desestruturando, com aumento de preços, do desemprego, da fome e da miséria. 

A oposição de Rosa, de Karl Liebknecht (único deputado do SPD que votou contra os créditos de guerra em dezembro de 1914), de Clara Zetkin, entre outros, à guerra os levou a criarem, ainda em 1914, a chamada 'Liga Spartacus', que procurou desenvolver atividades contrárias à participação alemã na guerra (promovendo greves, divulgando de cartas e manifestos, realizando manifestações). 

August Bebel, ao centro, foi um dos fundadores do Partido Social Democrata, em 1875, junto com Ferdinan Lassalle e Karl Liebknecht.

Rosa ficou foi presa em Julho de 1916 (foi libertada apenas em 08 de Novembro de 1918). Posteriormente, em Abril de 1917, a Liga Spartacus se integrou ao Partido Social Democrata Independente (USPD), formado por dissidentes do SPD que discordavam da política de apoio à Guerra. 

A Liga Spartacus atuou como um grupo independente dentro do USPD. Este chegou a conquistar 19,7% dos votos nas eleições para o Parlamento realizadas em 1920, ficando atrás apenas do SPD.

A libertação de Rosa aconteceu apenas depois que a guerra havia terminado, com a derrota da Alemanha Imperial, bem como devido à vitória da Revolução Democrática de Novembro de 1918. Daí, ela vai para Berlim, a fim de participar da Revolução e passa a dirigir o jornal 'Die Rote Fahna' ('A Bandeira Vermelha') e participa do Congresso que fundou o Partido Comunista Alemão (KPD). 

Um texto de autoria de Rosa ('O que quer a Liga Spartacas?') torna-se o programa do KPD.

A Revolução Alemã de Novembro de 1918 derrubou a Monarquia,  enviou a família imperial para o exílio e permitiu a conquista do comando do governo do país para o SPD, que era o maior partido do país. E é claro que a saúde de Rosa já estava bastante debilitada em função do longo período de prisão.

E logo depois, o novo governo Republicano, liderado pelo SPD, proclamou a República, adotou o Parlamentarismo, convocou eleições para a Assembleia Constituinte (que foram realizadas em Janeiro de 1919 e que deram uma forte vitória ao SPD), bem como implementou inúmeras reformas sociais progressistas (direito de voto para as mulheres, jornada de 8 horas diárias, etc).

Com isso, o novo governo Republicano conquistou um grande apoio popular, fato este que não foi levado em consideração pelos líderes da chamada Insurreição Espartaquista, que estourou em Janeiro de 1919. Essa insurreição tinha como objetivo derrubar o governo Republicano liderado pelo SPD e foi iniciada por alguns líderes do USPD, da Liga Spartacus (Karl Liebknecht e Wilhelm Pieck) e dos chamados Delegados Revolucionários. 

Porém, a própria Rosa Luxemburgo não foi sequer avisada que a Liga Spartacus iria participar da Insurreição, que se limitou a acontecer em Berlim, e tentou, sem sucesso, convencer Liebknecht a recuar. 

Rosa Luxemburgo discursa para trabalhadores filiados ao Partido Social Democrata (SPD). Do lado direito vemos a imagem de Ferdinand Lassalle, um dos fundadores do SPD e que defendia um caminho pacífico para se chegar ao Socialismo.

Rosa explicou a sua visão sobre os acontecimentos, dizendo que o proletariado alemão ainda não estava pronto para desencadear uma Revolução Socialista e que se eles insistissem em continuar com aquela tentativa revolucionária sem ter o apoio do proletariado, então a derrota era inevitável e todos eles acabariam massacrados. 

Ela também disse que a vitória da Insurreição apenas em Berlim de nada resolveria, pois toda a Alemanha ficaria nas mãos das forças conservadoras, que acabariam se unido para derrotar um eventual governo revolucionário que se instalasse em Berlim. Então, esse governo não iria durar muito tempo.

Liebknecht recusou-se a retirar os integrantes da Liga Spartacus da Insurreição que terminou, tal como Rosa corretamente previu, com uma fragorosa derrota e que resultou no assassinato de ambos por forças paramilitares de Extrema Direita (os Freikorps) em Janeiro de 1919.

O interessante é que, durante todos os muitos anos de atividade política e intelectual, e tal como foi mostrado no filme, os líderes da Liga Spartacus sempre disseram que quem deveria tomar a decisão de fazer a Revolução Socialista seria o proletariado e não os líderes ou dirigentes dos movimentos ou partidos. 

No momento em que Liekbnecht e Pieck abandonaram essa política, a derrota tornou-se inevitável. 

Rosa Luxemburgo e Karl Liebknecht.

Informações Adicionais!

Título: Rosa Luxemburgo;

Diretora: Margarethe von Trotta;

Roteiro: Margarethe von Trotta;

Gênero: Drama Histórico; Biografia; Duração: 120 minutos;

País e Ano de Produção: Alemanha Ocidental e Tchecoslováquia;

Música: Nicolas Economou;

Fotografia: Franz Rath; Montagem: Dagmar Hirtz e Galip Yyitanir;

Elenco: Barbara Sukowa (Rosa Luxemburgo); Otto Sander (Karl Liebknecht); Daniel Olbrychski (Leo Jogiches); Doris Schade (Clara Zetkin); Jurgen Holtz (Karl Kautsky); Adelheid Arndt (Luise Kautsky); Jan Biczycki (August Bebel); Karin Baal (Mathilde Jacob); Winfried Glatzeder (Paul Levi); Regina Lemnitz (Gertrud); Katharina Seyferth (Elizabeth); Eva Jakoubková (Sonya Liebknecht); 

Prêmios: Melhor Atriz no Festival de Cannes de 1986 para Barbara Sukowa (empatada com Fernanda Torres).

Biografia de Rosa Luxemburgo escrita por Paul Frolich e que foi lançada no Brasil pela Editora Boitempo em 2019. É uma leitura imprescindível para se conhecer sua vida e sua obra.

Trailer do filme:

Links:

Margarethe von Trotta:

https://www.imdb.com/name/nm0903137/?ref_=nv_sr_srsg_0

Filme 'Rosa Luxemburgo':

https://www.imdb.com/title/tt0091869/?ref_=nm_flmg_c_21_dr

Carta de Natal de Rosa Luxemburgo:

https://www.esquerda.net/artigo/carta-de-natal-de-rosa-luxemburgo/58743

Isabel Loureiro comenta a biografia de Paul Frolich:


Debate sobre a biografia de Rosa Luxemburgo (de autoria de Paul Frolich):

https://www.youtube.com/watch?v=1vbAFQMlLxk

A Teoria da Revolução na obra de Rosa Luxemburgo:

https://www.youtube.com/watch?v=wp1tIa3o3jk

O Marxismo de Rosa Luxemburgo:

https://www.youtube.com/watch?v=jr1vCm8G5YU

A Constituição da República de Weimar (1919) - por Fábio Konder Comparato:

http://www.dhnet.org.br/educar/redeedh/anthist/alema1919.htm

Rosa Luxemburgo recebe a informação de que a Alemanha Imperial foi derrotada na Guerra e que o SPD passou a governar o país, que se tornou uma República Parlamentarista.

DVD com 3 filmes de Margarethe von Trotta do 'Obras-Primas do Cinema': 

https://www.youtube.com/watch?v=XI26TGZBUDc&t=109s

https://www.youtube.com/watch?v=XI26TGZBUDc

100 anos sem Rosa Luxemburgo: uma vida pela Revolução:

ttps://www.brasildefato.com.br/2019/01/15/cem-anos-sem-rosa-luxemburgo-uma-vida-pela-revolucao

Michael Lowy comenta a biografia de Rosa Luxemburgo escrita por Paul Frolich:

https://blogdaboitempo.com.br/2019/03/12/michael-lowy-rosa-luxemburgo-pensamento-e-acao/

História do SPD:

https://pt.wikipedia.org/wiki/Partido_Social-Democrata_da_Alemanha

Rosa Luxemburgo é presa e, depois, foi assassinada pelos Freikorps (grupos paramilitares de Extrema Direita), no mesmo dia em que Karl Liebknecht também foi assassinado pelos mesmos Freikorps.

Julius Martov e a Revolução Russa:

https://www.fundacaoastrojildo.org.br/9980/

Clara Zetkin:

https://autonomialiteraria.com.br/conheca-clara-zetkin-a-feminista-antifascista-que-impulsionou-o-dia-internacional-da-mulher/

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